Uma coisa
maravilhosa é o cheiro de uma comida que nos agrada. Num domingo de janeiro, quando
se sentou à mesa do almoço, a Taís fez todos rirem porque se saiu com esta:
- Que
cheiro bom de pequi!
Tanto o pai
quanto a mãe vigiam a quantidade, porque a mocinha de quatro aninhos, se
brincar, perde a conta e come só e apenasmente pequi com arroz. Já teve dia
assim. Foi quando a avó pegou uma faca e, em vez do caldo, como fazia a mãe,
cortou e pôs no prato da mocinha um tantão de lascas saborosas do fruto.
Certa vez,
ouvi de um cunhado - ele já fez a viagem - que crianças não deviam ter o direito de comer quando a
quantidade é pouca e a comida muito boa, porque elas não sabem saborear. Todos
que ouviram riram. Eu discordei, calada. Os sabores da minha infância foram
muito mais apreciados... Foram tão intensos que, muitas vezes, apenas o cheiro
remete para o que foi degustado como se não fosse haver o amanhã. O certo é que
houve; aqui estou eu! Mas nada é tão saboroso quanto foi registrado na memória...
Assim
provou a Taís! Ela gosta tanto, mas tanto de pequi que, de férias, na praia lá
em Guaibim, na Bahia, quando o pai perguntou o que ela queria almoçar, ela
respondeu: “o pequi da vovó!”.
Vendo a
importância do prato na vida da minha pequena, resolvi escrever meu jeito de
fazê-lo. Para que ela tenha o poder – quando crescer - de comer pequi e lembrar
que a felicidade, às vezes, está guardada numa lembrança simples da infância.
Comprei
dois litros (21 frutos bem grandes) de pequi e lavei-os bem, antes de
colocá-los em uma panela. Acrescentei três copos (americano) de água; uma
colher (sopa, rasa) de óleo de soja; uma colher (sopa, rasa) de açafrão em pó;
um caldo de galinha caipira; duas colheres (sopa, rasa) de açúcar; uma cebola
picada e uma pimenta cumari amarela (curtida). Levei ao fogo, mexi quando
ferveu, tampei a panela, deixando espaço para sair o vapor e deixei cozinhar
por quase meia hora. Pronto! O caldo fica meio espesso e o fruto cozidinho para
ser raspado no dente, com cuidado, por causa dos inimigos espinhos que ficam
por trás da polpa amarela.
O cheiro
que se espalha no ar é convite para saborear a iguaria sem remorso.
Mesmo
sabendo que a quantidade de papilas gustativas na língua de uma criança é
infinitamente maior que na de um adulto – vem daí, portanto, a intensidade das
nossas lembranças dos sabores na infância - quando o pequi ao molho vai
escasseando na panela, sinto aquele impulso egoísta que meu cunhado sentia e
preciso refrear minha vontade de esconder a vasilha para poder atacá-la sozinha
depois...
Pequizeiro em flor
(foto de minha autoria, num momento encantado, quando em excursão pelo cerrado, perto de Santo Antônio do Descoberto)
Pequizeiro em flor
(foto de minha autoria, num momento encantado, quando em excursão pelo cerrado, perto de Santo Antônio do Descoberto)