segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

PEQUI AO MOLHO

Uma coisa maravilhosa é o cheiro de uma comida que nos agrada. Num domingo de janeiro, quando se sentou à mesa do almoço, a Taís fez todos rirem porque se saiu com esta:
- Que cheiro bom de pequi!
Tanto o pai quanto a mãe vigiam a quantidade, porque a mocinha de quatro aninhos, se brincar, perde a conta e come só e apenasmente pequi com arroz. Já teve dia assim. Foi quando a avó pegou uma faca e, em vez do caldo, como fazia a mãe, cortou e pôs no prato da mocinha um tantão de lascas saborosas do fruto.

Certa vez, ouvi de um cunhado - ele já fez a viagem - que crianças não deviam ter o direito de comer quando a quantidade é pouca e a comida muito boa, porque elas não sabem saborear. Todos que ouviram riram. Eu discordei, calada. Os sabores da minha infância foram muito mais apreciados... Foram tão intensos que, muitas vezes, apenas o cheiro remete para o que foi degustado como se não fosse haver o amanhã. O certo é que houve; aqui estou eu! Mas nada é tão saboroso quanto foi registrado na memória...
Assim provou a Taís! Ela gosta tanto, mas tanto de pequi que, de férias, na praia lá em Guaibim, na Bahia, quando o pai perguntou o que ela queria almoçar, ela respondeu: “o pequi da vovó!”.
Vendo a importância do prato na vida da minha pequena, resolvi escrever meu jeito de fazê-lo. Para que ela tenha o poder – quando crescer - de comer pequi e lembrar que a felicidade, às vezes, está guardada numa lembrança simples da infância.
Comprei dois litros (21 frutos bem grandes) de pequi e lavei-os bem, antes de colocá-los em uma panela. Acrescentei três copos (americano) de água; uma colher (sopa, rasa) de óleo de soja; uma colher (sopa, rasa) de açafrão em pó; um caldo de galinha caipira; duas colheres (sopa, rasa) de açúcar; uma cebola picada e uma pimenta cumari amarela (curtida). Levei ao fogo, mexi quando ferveu, tampei a panela, deixando espaço para sair o vapor e deixei cozinhar por quase meia hora. Pronto! O caldo fica meio espesso e o fruto cozidinho para ser raspado no dente, com cuidado, por causa dos inimigos espinhos que ficam por trás da polpa amarela.
O cheiro que se espalha no ar é convite para saborear a iguaria sem remorso.

Mesmo sabendo que a quantidade de papilas gustativas na língua de uma criança é infinitamente maior que na de um adulto – vem daí, portanto, a intensidade das nossas lembranças dos sabores na infância - quando o pequi ao molho vai escasseando na panela, sinto aquele impulso egoísta que meu cunhado sentia e preciso refrear minha vontade de esconder a vasilha para poder atacá-la sozinha depois... 
                                  Pequizeiro em flor
(foto de minha autoria, num momento encantado, quando em excursão pelo cerrado, perto de Santo Antônio do Descoberto)

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