Na minha casa, sempre nos reuníamos, com gosto,
em volta de uma panela de canjica doce. Terminava aí meu conhecimento de como
utilizar a canjica; tanto a do milho branco, como a do amarelo. Pois a
canjiquinha – o mesmo milho amarelo da canjica processado em tamanho menor -
tem uma vantagem cativante: pode ser doce ou agregada a ingredientes variados,
sendo servida salgada. Que delícia!
Na escola pública onde lecionava, em dia de
canjiquinha, até o brilho dos olhos dos alunos parecia refletir mais alegria.
Foi onde conheci o prato que destaco hoje.
Normalmente, os professores não tinham o
direito de lanchar, mas, se o cardápio oferecia o tal prato, o grupo
participava comprando ingredientes e a merendeira aumentava a quantidade para
que nós também nos deliciássemos.
Faço com carne de sol; ou com frango em pedaços
e milho verde refogado à parte e incorporado ao prato, na hora de servir; ou com
músculo, que também cozinho à parte; ou com carne moída... Mas o meu predileto
é do jeito que me foi apresentada, no ano de 76; com frango. Também é conhecido
como xerém.
Um pacote de canjiquinha de meio quilo e um
frango caipira inteiro são os ingredientes básicos para este prato.
A primeira, inicialmente, foi lavada e deixada
com água suficiente para cobri-la, com o objetivo de facilitar o cozimento após
ficar de molho. Tive o cuidado de utilizar água quente, bem quente, para
acelerar o processo. E reservei.
O frango picado recebeu o suco de dois limões
e, depois de ter mexido, para uniformizar o líquido nos pedaços, fervi água e despejei
sobre para uma boa escaldada. Temperei com uma colher (sopa) do meu tempero e
reservei também.
Em uma panela de pressão, pus a canjiquinha e
água suficiente para cobri-la, mais o equivalente à medida de dois dedos acima
e liguei o fogo.
Depois, acendi a chama mais alta do meu fogão e
parti para o preparo do frango, numa panela bem grande, com um copo de óleo. Panela
grande, pois, vai chegar a hora de juntar a canjiquinha e o frango. Quando o
óleo esquentou bem, distribuí um terço dos pedaços e esperei fritar de um lado
para virar cada pedaço e fritar do outro lado. Retirei a primeira leva frita e
reservei e fiz o mesmo procedimento, mais duas vezes, com os outros pedaços,
até ver todos fritos. Despejei o óleo da fritura em embalagem apropriada para
utilizar quando for fazer sabão líquido. Voltei a panela para o fogo, pus meia
xícara (chá) de óleo para esquentar e uma cebola ralada que esperei ficar da
cor da borra de café. Aí, refoguei os pedaços de frango, acrescentei uma colher
(sopa, rasa ) de açafrão; um tablete de caldo de galinha Knorr; uma colher
(sopa, rasa) de açúcar; uma colher (sobremesa, rasa) de pimenta-do-reino e mexi
para espalhar o tempero. Assim que percebi que estava bem incorporado, acrescentei
dois litros de água que fervia em caneca, sob chama ao lado. E deixei cozinhar
em fogo normal.
Não escutar o barulho da cidade é o maior bem
que a vida na roça me proporciona. Tem dia que passarinho me incomoda. Gosto de
ouvir meus pensamentos. Quando estou envolvida com um prato que me traz gratas
lembranças, como é o caso deste de hoje, gosto de revisitar as agradáveis lembranças
das companhias com quem compartilhei muito tempo bom na minha vida
profissional. Sáo tantos e muitos os amigos e conhecidos que tomaram rumos
diferentes, mas vivem na minha lembrança...
Também cortei, refoguei o milho de oito espigas
e preparei um cozido de milho verde, bem novinho, que reservei. A receita está
no blog.
Logo, logo, a canjiquinha ficou no ponto de ser
misturada ao frango. Assim que o frango amoleceu bem e quase secou o caldo,
despejei a canjiquinha sobre o frango, acrescentei mais água e experimentei o
ponto certo do sal. Mexendo sempre, com cuidado para não deixar agarrar ao
fundo, mas permitindo que carne e osso fiquem desgarrados sem uniformidade, experimentei
muitas vezes para sentir se incorporou sabor. Acrescentei, então, o milho verde
refogado e desliguei o fogo, considerando o prato pronto. Não costumo pôr
cebolinha e salsinha no xerém. Sirvo separadamente. Quem gosta, serve-se à
vontade.
Nesta vida, há momentos marcantes que merecem
reverência. Somos privilegiados quando saboreamos pratos assim como o xerém,
sentindo o afago das imagens doces dos momentos vividos na companhia de gente
do bem que fazia, em Taguatinga, a mágica da educação prevalecer na garantia de
melhor futuro para muitos.
Uma gostosura reviver lembranças com sabores...
Tá servido?